Bate-papo com a jornalista e escritora lotou as imediações da Associação Comercial no último dia da programação
Texto: Izadora Garcia
Fotos: Renner Boldrino
Centenas
de pessoas se reuniram, ansiosas, nas imediações da Rua Sá e Albuquerque para
ouvir Manuela d’Avila falar sobre feminismo, conjuntura política atual, fake news e, claro, sobre sua filha
Laura. O bate-papo aconteceu ontem (10), nas escadarias da Associação Comercial
e foi uma das atividades mais esperadas da 9ª Bienal Internacional do Livro de
Alagoas.
Lançando
os livros Revolução Laura: reflexões
sobre maternidade e resistência e Por
que lutamos? Um livro sobre amor e liberdade, com exemplares esgotados em
toda a feira, a jornalista e escritora, que foi candidata à vice-presidência
nas últimas eleições, iniciou a palestra falando sobre a importância de eventos
que promovem a leitura e a ocupação das ruas.
“Tenho
acompanhado as atividades da Bienal desde o primeiro dia e estou muito feliz
com o sucesso deste evento de cultura e arte, principalmente porque ele está
sendo realizado na rua, em espaços públicos que devem ser ocupados”, comemorou.
Com
um tom descontraído, d’Ávila tratou da importância de não desistir do diálogo
com pessoas que atacam o movimento feminista e a esquerda. Segundo ela, a
hostilidade é fomentada pelo desconhecimento e esclarecer por que essas causas
são importantes é bem mais eficaz que o afastamento de quem pensa diferente.
Sem poupar críticas à família Bolsonaro, falou sobre a agressividade no campo
político e como o machismo teceu seu papel no processo de impeachment da ex-presidente Dilma Roussef.
A
escritora também fez um relato emocionado sobre como sua vida pessoal foi
afetada pelas fake news durante a
campanha eleitoral, iniciada em 2017: ela foi agredida e hostilizada em
incontáveis ocasiões por ser associada a mentiras como a de que era autora de
um projeto que legalizava o estupro de crianças. As ofensas se estenderam à sua
família, incluindo a filha de apenas 4 anos, Laura.
De
acordo com d’Avila, mesmo as notícias mais absurdas, encontraram quem
acreditasse nelas. Isso porque foram direcionadas a um público específico,
traçado por dados pessoais coletados diariamente por meio dos smartphones.
“Esses aparelhos conhecem vocês muito bem, no que vocês são propensos a
acreditar, coisas que vocês levariam anos de terapia para descobrir e entender
sobre vocês mesmos”, brincou.
Mas
o assunto é sério: a coleta inadvertida de dados que foram utilizados para
influenciar pessoas durante campanhas eleitorais em diversos países culminou em
um escândalo protagonizado pelas empresas Facebook e Cambridge Analytica.
Outro
ponto abordado no bate-papo foi a maternidade e o relacionamento com Laura, que
é tema do seu primeiro livro. Para a escritora, a experiência de cuidar da
filha em meio a uma conturbada campanha eleitoral foi cansativa, mas também
representou a única maneira de manter a sanidade mental.
“Eu
precisava chegar em casa, depois de passar o dia ouvindo coisas horrorosas ao
meu respeito, e me conectar a uma criança de 8 anos que só queria amor e ver
Masha e o Urso. Minha filha salvou a minha saúde mental e a minha vida”, se
emocionou.
Manuela
também destacou o orgulho de participar de uma bienal realizada por uma
universidade federal e sobre a importância da luta para o fortalecimento das
instituições públicas de ensino superior.
“Lutamos
[a esquerda, nos governos petistas de Lula e Dilma Roussef] para que as universidades
não fossem um lugar apenas para as elites. Democratizamos o acesso na esperança
de que aquele estudante pobre, que é o primeiro da família a cursar uma
graduação, ‘chegue chegando’. Compartilhe seus conhecimentos com as pessoas do
seu entorno e ajude a mudar outras realidades. Esperamos que ele convença
outras pessoas que é importante ocupar esses espaços”, frisou.
“Também
fizemos isso porque sabemos que quando um médico que foi usuário do SUS colocar
os pés em um hospital público, o Sistema Único de Saúde nunca mais vai ser o
mesmo, que ele nunca vai zombar de alguém que não sabe pronunciar o nome de uma
doença. Democratizar o acesso às universidades públicas é uma forma de
perpetuar a dignidade”, frisou, emocionando pessoas que relembraram suas trajetórias
pessoais.
“Ver
uma universidade promovendo uma bienal assim, no meio da rua, em um espaço
público, democratizando o conhecimento e a cultura, em uma conjuntura política
tão adversa é uma alegria. É preciso coragem e vontade de mudar para realizar
algo assim. Essa bienal é resistência”, comemorou.
Manuela
d’Avila se despediu de Maceió dizendo que o Nordeste a encheu de esperança de
novo. Para as centenas de pessoas que enfrentaram o calor e o cansaço para
vê-la falar sobre maternidade, feminismo e consciência política, com amor,
leveza e bom-humor, a esperança ressurgiu também.